Charme e erudição se misturam nas mesas do Caffè Florian, o refúgio perfeito para se fazer uma longa pausa em Veneza
Fundado em 1720, o Caffè Florian foi refúgio de personalidades como Goethe, Rousseau, Balzac, Proust e Hemingway, entre outros
Veneza fervilha neste começo de setembro com a abertura da 12ª edição da Bienal de Arquitetura e a realização da 67ª edição do Festival Internacional de Cinema. Astros de Hollywood misturam-se a arquitetos renomados no frenezi de gôndolas.
Mas é na Piazza San Marco, entre quatrocentas janelas arredondadas como ondas idealizadas, que encontramos, ancorado, um dos refúgios mais românticos e charmosos do mundo, o Caffè Florian.
Sofás de veludo vermelho e detalhes em dourado e verde se misturam para criar uma sensação fascinante
Instalado por Floriano Francesconi nas arcadas da Procuratie Nuove, vira ponto de referência e abriga clientela que, por mais de 290 anos, vem se satisfazendo com o mesmo café de qualidade: Goethe, Rousseau, Madame de Staël, Chateaubriand, Benjamin Constant, Stendhal, Lord Byron, George Sand, Alfred de Musset, Taine, Charles Dickens, Théophile Gautier, Alexandre Dumas (pai), Henry James, Balzac, Marcel Proust, Modigliani, Rubistein, Stravinsky e, claro, não esquecer, sempre na melhor das companhias femininas, Casanova — provavelmente um dos poucos a despertar a inveja de Hemingway, outro freqüentador.
Viver Veneza inclui caminhar por suas ruas estreitas e solitárias, perder-se no labirinto da busca de nós mesmos para, depois, ocupar longas horas numa das mesinhas desse tesouro, café símbolo da cidade. Como se faz desde 1720, deve-se sentar cosmopolitamente com a xícara, o copo de água bem gelada, o discreto acompanhamento da orquestrinha do lugar.
Tanto no terraço, como dentro, nas saletas decoradas com afrescos exóticos que remetem à Arábia e à China, a atmosfera é nostálgica. Dourados, sofás de veludo vermelho e leves tonalidades de verde se misturam para criar uma sensação fascinante. Mármore, bules, porcelana fina, um licor Strega e muita conversa arrematam a visita.
A boca não fica descuidada. Bebe-se Moscato, vinho cor de âmbar. Há guloseimas, chocolates com especiarias, sorvetes de frutas e doce de amêndoas. Para o café, os italianos preferem o ristretto (curto, como chamamos por aqui). Pode-se pedir, principalmente se faz frio e a névoa lentamente invade, com Amaretto — inesquecível.
Somando tudo, o que vemos é um resumo prodigioso daquilo que se pode chamar de cultura de cafeteria: expressão de certo modo de vida, determinada forma de convivialidade.
Temos, por um lado, uma proposta para passar o tempo, deixar o pensamento e a imaginação flanar no efêmero — sonhar, ler o jornal, jogar xadrez, anotar metafísicas no bloquinho. Por outro lado, possibilidades de discussões espirituosas sobre arte, cultura, política. Prazer de viver e vibração do pensamento sob o mesmo teto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário